6.10.09

A lei do torcedor

Ainda na onda do policamente correto...

No início de um dia de trabalho, estava tomando café com alguns companheiros, quando a discussão de um velho assunto apareceu de uma nova maneira.
Um dos homens, pai de um pequeno menino, apresentava-se indignado com o fato de que seu filho sofrera uma intervenção descabida, realizada pelo seu professor de natação. O garoto, ao chegar para aula, vestindo um uniforme do Corinthians, tinha sido interceptado pelo professor, que afirmou que o agasalho do Corinthians era feio e o do São Paulo era bonito. O pai estava indignado, não simplesmente pelo fato dele mesmo ser corintiano e odiar o São Paulo, o que seria normal na lógica de torcedor, mas ele dizia estar bravo realmente como pai, por achar a intervenção do professor ilegítima. Falava ainda, que ia fazer uma reclamação oficial para diretoria da entidade que empregava o professor. E se fosse necessário tomaria as medidas legais para resolver o assunto. Iniciou-se daí, uma discussão, no meu ponto de visto saudável e extremamente importante na mesa.

Éramos cinco, todos profissionais do mercado de comunicação, então as opiniões, neste caso, são todas vindas de um universo social próximo em certa análise.
A maioria concordou com o pai, achando um grande absurdo na situação, pois o menino, ainda com três anos, está com a sua personalidade sendo formada.
Um professor jamais tem o direito de contestar posições sociais do aluno, contanto que elas não sejam desvios de caráter ou ilegais. E mais grave, por receber uma autoridade investida pelos próprios pais e pela escola, o profissional não pode distorcer o gosto e as escolhas da criança, quer elas sejam escolhidas pelo menino ou sejam ensinamentos dos pais ao guri. Isto poderia gerar traumas alarmantes ou silenciosos em uma personalidade em constituição. A atitude passa assim, a ser pouco educacional.
Além disso, o pai dizia não achar certo contratar uma pessoa, que sem motivos, criticava decisões dele para seu filho. Já que este é um papel, de decidir pelo garoto, cabe primeiramente aos pais até o momento em que o filho amadurece e pode escolher sozinho.

Eu, na verdade, concordei com tudo isso a não ser por um simples fato, que para mim parecia ser essencial na discussão. Estávamos falando sobre futebol. Levo muito a serio o esporte, e por levá-lo tão a sério, não posso deixar de acreditar que o esporte é extremamente divertido, e torcer por um time é uma emocionante brincadeira.
Considerando, pois eu não estava presente durante a ocorrência, que o professor fez um comentário sem maldade e violência, já que estava falando com uma pessoa de três anos com o qual tem algum laço de relacionamento, eu encaro o acontecido com certa relevância.
Óbvio que se houver qualquer intenção de agressividade impressa na situação, mesmo que verbal, isto faz do professor uma figura ridícula, a qual não pode nem permanecer próxima a crianças.

Se estivéssemos falando sobre religião, por exemplo, acho que o assunto seria mais delicado, mesmo acreditando que exista brecha para comentários, contestações e ensinamentos multilaterais, sempre que feitos com respeito. Mas tratando-se de um assunto tão profundo quanto crença religiosa, a autoridade precisa ser dada a alguém e em primeira instância acho que sempre deve ser dada aos pais.
Não acho que torcer por um time de futebol tenha tal profundidade, mesmo com algumas pessoas comparando o amor pelo time com algo santo, mesmo com a vitória ou a derrota de um time alterar tanto nossas emoções, mesmo eu tendo assistido a muito mais jogos do que missas em minha vida.
Veja, que sou torcedor apaixonado e praticante. E sou visceralmente, totalmente contra amigos, avós, tios, vizinhos, pessoas próximas, que levam pequenos uniformes, brasões ou qualquer tipo de manifestação provocativa aos pais até a maternidade no dia do nascimento do filho. Literalmente, se isso acontecer comigo, tais objetos sairão voando pela janela.

Acho que apesar da provocação saudável ser parte fundamental da torcida, é preciso ter limites e medidas para cada momento. Não gostaria de deixar para meu filho um mundo em que, pelo simples fato de torcer para um time diferente, uma pessoa agride a outra. Infelizmente, isto é uma prática comum. Espero que mude em pouco tempo. Acho que já estamos nos educando um pouco mais.
Mas também tenho muito medo de deixar para as próximas gerações um mundo politicamente correto em demasia, tão asséptico, que tudo seja regulamentado, legislado, carimbado e pré-avaliado.
Que mundo seria esse, sem confiar nem um pouquinho no ser humano? Será que a proteção valeria a pena? Prefiro deixar as coisas um pouquinho mais abertas, um pouco mais natural. Acho que pequenas provocações, pequenas porradas, pequenos conflitos fazem parte da vida, mesmo para uma criança e isto nos faz crescer, amadurecer e ficar mais fortes. E perceba que digo “pequenas e pequenos”. Sou a favor de que muita coisa, como a violência nos estádios e fora dele, seja legislada e coibida sem qualquer permissividade.
Mas prefiro um mundo em que a algumas coisas se afinem no âmbito da informalidade e não no âmbito oficial. Acho normal um professor fazer uma brincadeira sobre o time com um moleque, independentemente de sua idade. Acho normal o pai ensinar o filho a responder para o professor que são paulino é tudo bobo (creio que bambi seria um pouco demais para tal situação).

Sei que pelos pilares de educação da UNESCO, esta pode não ser a atitude mais correta, mas o que vou fazer? Prefiro um mundo assim. Acho normal também o pai virar para o professor e falar “Sou corintiano, meu filho é corintiano, não quero brincadeiras.”, mesmo que o argumento não seja tão racional.
Mas não acho nada normal a queixa no âmbito oficial ou legal. Senão, daqui a pouco, falar sobre futebol e adjacentes será enquadrado dentro dos assuntos em que todo mundo pensa 6 vezes antes de falar. Aqueles assuntos em que as pessoas acham bonito falar a resposta a qual todo mundo espera ouvir. Insisto, torcer por um time é tão emocionante, porque existem os adversários e dentro de limite saudável, nunca sabemos o que esperar.
E bem lá no fundo, não entendo porque tanta discussão, qualquer pessoa, com o mínimo de intelecto e bom senso, sabe que o agasalho santista é bem mais bonito do que dos gambás e dos bambis.

1 comment:

Unknown said...

futebol é religião :)